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13/09/2023 Paulo
Cezar S Ventura Pessoas idosas, setembro amarelo, suicídio
O
que mais nos chama a atenção é o grande número de pessoas idosas que se matam:
uma média de 1200 suicídios de pessoas idosas, por ano, no Brasil
Em
março de 1998 estive presente no Espaço de Exposições da Porta de Versalhes, em
Paris, porque ali acontecia o Salon du Livre que, naquele ano,
homenageava a literatura brasileira. Tive a oportunidade de ver o lançamento de
obras de autores como Chico Buarque, Lygia Fagundes Teles e outros que, mesmo
não sendo os meus preferidos, como José Sarney lançando Maribondos de Fogo, e Paulo
Coelho com seu Alquimista, estavam ali representando nossa cultura.
Fui
assistir a palestra de Lygia Fagundes Teles, que discursava sobre o poder das
palavras e o cuidado que os escritores devem ter ao fazer suas escolhas, quando
os assentos livres a meu lado foram ocupados. Viro a cabeça e quem eu vejo? A
atriz Catherine Deneuve, a Belle de Jour, e uma assessora. Fiquei com ouvidos
em Lygia, nariz em Catherine, para sentir seu perfume, e olhos entre as duas.
Por
que estou a lembrar-me disso? Anos mais tarde, já de volta ao Brasil e
residindo em Belo Horizonte, fui chamado a correr até a casa de minha irmã, 2
km próximos, porque seu filho havia tentado se matar. Não corri, voei até lá e
ajudei-a a conduzi-lo até a Unidade de Pronto Atendimento, por sorte bem perto.
Ele se tratava de uma forte depressão e engoliu todos os medicamentos
prescritos de uma vez. Uma lavagem estomacal deu conta de trazê-lo de volta à
vida.
Comecei, então, a
dedicar-lhe os poemas que passei a escrever sobre a importância dos pequenos
prazeres. Cada um que escrevia eu lhe enviava e todos eles terminavam com uma
reverência à vida e à importância de manter-se vivo. Em um deles eu comentava a
respeito daquele famoso encontro entre Lygia, Catherine e eu.
Brindemos
nossas musas, Cecéu,pela eternidade delas através de nosso testemunho.
Viver nelas (como escreveu Yoko Ono)
é uma dádiva e uma necessidade.
Cecéu
tinha menos de vinte anos, sobreviveu, formou-se em Psicologia e hoje cuida de
pacientes mentais em situação de risco em uma cidade do interior de Minas
Gerais. Mas, os suicídios continuam um grande problema. Enquanto os jovens
suicidas são bem-sucedidos no ato em 1 a cada 200 tentativas, as pessoas idosas suicidas têm sucesso em sua própria morte em
1 a cada 4 tentativas. Porque eles planejam melhor a própria morte e, em geral,
vivem solitários. Quando são encontrados já estão mortos.
O
que mais nos chama a atenção é o grande número de pessoas idosas que se matam:
uma média de 1200 suicídios de pessoas idosas, por ano, no Brasil. O
caso mais próximo a mim, foi a de um conhecido conterrâneo, ex-vereador e
ex-secretário de cultura da cidade, que se matou recentemente, causando
comoção. Em princípio, a família negou o suicídio, alegou infarto fulminante, o
que foi desmentido pelo laudo médico. Esconder o fato apenas leva a
subnotificações e esconde, na verdade, o grande problema.
Causas
reais? O padrão, depressão. Outras causas são também o alcoolismo (o que
justifica um número maior de suicídios entre pessoas idosas do sexo masculino,
segundo professores do Departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina da
UFMG), as dores crônicas e o diagnóstico de demência. As mortes auto infligidas
de pessoas famosas como os atores Flávio Migliaccio (aos 85 anos) e Walmor
Chagas (aos 82 anos) trouxeram o assunto à discussão, mas nada mudou, porque
mudanças exigem ações mais contundentes, as quais não somos capazes de
realizar, ainda.
É
possível reduzir, até mesmo evitar, a morte por suicídio de pessoas idosas?
Entre os profissionais de cuidados, não apenas de pessoas idosas, há até um
slogan conhecido que mostra um provável caminho – proteger as pessoas contra os
4 D: desespero; desesperança; desamparo; três fatores que levam ao quarto, a
depressão. E a depressão, por sua vez, pode conduzir ao suicídio. Os primeiros
sintomas visíveis desses 4 D são a tristeza, a falta de vontade de fazer as
coisas de sempre e a falta de prazer no cotidiano.
Assisti
recentemente um documentário sobre cinco lugares no mundo onde há um grande e
incomum número de pessoas centenárias, os denominados Zonas Azuis. Esses
lugares são: Okinawa, no Japão; Sardenha, na Itália; Nicoya, na Costa Rica; Loma Linda,
na Califórnia; e Ikaria, na Grécia. Em cada um desses lugares fatores
culturais e ambientais ajudam a promover a longevidade saudável, cada um deles
com suas características especiais. Os documentaristas, no entanto, resumiram
as regularidades dos casos em cinco, que descrevo aqui dando a minha
interpretação.
O
primeiro deles é o movimento. De novo, encabeçando
a lista, a atividade física regular, leve, de todo dia. Aquela caminhada
despretensiosa, o agacha-levanta das atividades comuns que, além de tudo,
ajudam no sono regenerador das energias.
A visão do
valedepois de subir a montanha
ao pôr-do-sol que se apresentava
valeu alguns anos de minha existência.
O
segundo é a presença de jardins e quintais. Eles têm múltiplos
benefícios pois ajudam na movimentação necessária e no cuidado com a
alimentação. A boa alimentação é sempre o segundo fator de todas as listas de
ajuda ao envelhecimento saudável.
Jeito
mineiro de viver perigosamente:
comer couve longe de seu quintal,
roubar muda de flores em jardins alheios.
O
terceiro tem a ver com os trabalhos manuais, quem diria? Fazer as
coisas com as mãos é terapêutico, pode provocar movimentos, treina a
concentração e ajuda a melhorar a saúde mental. Trabalhar com as mãos não é
negar a tecnologia, mas pode ser também usar a tecnologia a favor de novas
artes. Escrever, que é o meu caso, também se encaixa neste quesito.
Escrevo
meus versos para aprender
a encontrar a inspiração para melhor escrever.
O
quarto é viver com menos estresse. Todos os itens
anteriores ajudam a se estressar o menos possível. Fazer uma boa gestão da
ansiedade e do estresse exige uma mudança de paradigma no modo de vida que é,
principalmente, fazer uma boa gestão do tempo e da energia necessária para
todas as atividades. A saúde mental agradece, óbvio.
Tenho a
calma artesanalde quem fabrica vácuos
e cheira tolerâncias na atmosfera!
O
quinto item da lista resume, a meu ver, todo este bem viver: fazer da vida um ritual sagrado. E isso vai muito além dos rituais religiosos. A oração é
apenas uma das possibilidades. Os rituais sagrados incluem a respiração
consciente, a meditação, a dança, a amizade, o cuidado com os outros, os risos,
o ritual alimentar, o amor e a sedução, entre outras possibilidades.
É
possível se tornar centenário sem as mazelas da idade? Sim, é possível, mas não
sozinhos. É uma questão de vida em comum, de sociedade, de poder público, de
cultura, de vida em família, de valorização da vida, de abraçar a causa em
conjunto com a Urbis.
Não
nos deixem sós. Gostamos, e precisamos, de viver com amigos e familiares.
Felizes, enfim.
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