Pular para o conteúdo principal

Velhas Bonitonas de Maria Seruya

 Velhas Bonitonas é o projeto inspirador da artista plástica Maria Seruya que retrata o poder e beleza das mulheres que, com ou sem rugas, têm a capacidade de se se mostrarem autenticas. Uma beleza que vem da alma e que resulta das histórias dos dias já vividos e da ousadia pela vida vivida a cada momento tal como ela é, sem receio dos dias por viver.

Aprender a caminhar em direção à velhice, conforme nos diz Maria Seruya, é fundamental! Leia esta magnífica entrevista e inspire-se para essa caminhada.

 Maria Seruya e as suas Velhas Bonitonas – “Ousar ser quem somos.”

Falando da Maria Seruya “Velha Bonitona”, acha que este projeto alterou a sua forma de pensar e até compreender melhor a sua própria caminhada em direção à velhice? É a sua própria “coach” de desenvolvimento pessoal?

O envelhecimento nunca foi algo que me assustasse, sempre foi algo que admirei muito. Penso que se deve aos exemplos de vida inacreditáveis na minha família, nomeadamente de Mulheres, que sempre ambicionei seguir e ser.

Nunca pensei que ser velha era algo negativo porque sempre acreditei que com o tempo nos vamos tornando aquilo que mais ambicionámos ser. Que nos tornamos muito mais bonitas e livres.

Quase como se a vida se tornasse mais fácil.

Sempre foi a minha crença. Que o tempo nos cura e nos constrói. Para mim isso sempre foi claro. Talvez o que seja difícil para mim seja o processo para lá chegar, o caminho em si.

A grande mensagem na minha vida que o projeto Velhas Bonitonas veio expressar BEM ALTO e “sem complexos nem culpas” é que esse caminho é de facto possível.

Cada Velha que faço torna a minha vida mais clara, mais cheia, mais leve, mais intensa, com mais cor, com mais equilíbrio, ou liberta a minha dor.

Fazem-me chorar quando tenho de chorar, rir quando estou bem alegre, aguentar quando é preciso. Dão sentido à minha vida. Estas caras de personagens imaginárias passam energias bem reais que estão bem cá dentro e têm uma vontade gigante de viver, e de se materializar. Eu gosto de criar estas energias com a forma de mulheres que estão a envelhecer porque acredito que todas elas “sabem”. Sabem muito. Torna a mensagem com mais significado, tem mais força. O que me atrai e me faz continuar com a mesma vontade de as criar mesmo ao fim de três anos, é materializar essa sabedoria e conseguir poder criar algo “vivo”, com uma identidade nítida com a qual me posso relacionar, que posso contemplar e sentir de forma mais clara.

Não são necessariamente auto-retratos, são energias que vêm do meu interior e também do exterior, mas que adquirem a sua própria e única identidade em cada uma delas.

Depois há todo o lado social do projeto. Da mesma maneira que as Velhas Bonitonas me compensam a mim através da sua energia para aguentar, sentir, superar, sorrir, gritar,.. isto não acontece só comigo. É impressionante porque desde o inicio até hoje ninguém fica indiferente, todas as Mulheres que visualizam e se relacionam com as imagens identificam-se sempre com alguma delas, projetam-se nelas, muitas vezes sentem mesmo uma transformação. É como se recordassem algo de si mesmas. O facto de serem anónimas e imaginarias faz com que seja possível uma identificação direta porque não é ninguém que idolatram, alguma figura conhecida, são simplesmente pessoas iguais a qualquer uma de nós.

Para além da pintura tornou-se muito importante a relação com as Mulheres que se sentem transformadas. O projeto tem tido uma personalidade muito ativa na sociedade, deixando de ser apenas dedicado à pintura.

O projeto adquiriu também o formato de workshops, palestras, parcerias com instituições de solidariedade social e marcas, eventos de envelhecimento e eventos dedicados a Mulheres. Estamos em contacto com pessoas no nosso dia-a-dia e participamos na sua contrução como Mulheres de todas estas formas e claro, com a pintura.

No fundo este é um trabalho no seu todo que está muito ligado à minha construção como pessoa, da minha identidade, mas sempre em construção com o outro. Sempre em ligação com o outro. Sempre em relação. As pinturas são quase como se fossem um meio para essa relação, um quebra-gelo para o diálogo.

Não sinto necessidade de estar sempre a criar estas imagens, elas surgem no seu próprio tempo, tudo tem um sentido, tudo se liga. Mas claro que também é necessária disciplina e método.

 Maria Seruya fale-nos de sua “Velha Bonitona” preferida.

São mesmo TODAS. Cada uma delas tem vida própria, são todas importantes, cada uma à sua maneira. Muitas vezes nem as consigo logo ver, mas o seu valor vem sempre ao de cima seja ele qual for. São fortes, e mexem sempre comigo, sempre.

Mas há uma que sempre que a vejo parece que a sua energia é sempre aquela que em apenas um olhar, em apenas uma cara, em apenas uma personagem me diz tudo: A Velha Bonitona Pierrot.

 Ela diz-me que posso chorar, que não tenho de rir sempre mesmo sendo eu um “clown”. Ela é independente, observadora, está bem na sua pele e, profunda, olha-me nos olhos, tem uma lágrima, porque também sofre, mas aguenta. O seu olhar diz-me que posso sofrer de forma muito digna, sem vitimização. E está séria. Esta cara séria atrai-me e parece que me olha dizendo que fique séria também. Não de forma crua ou triste, mas para me encontrar, encontrar o meu silêncio para conseguir ver, tal como ela vê. Um ver mais profundo.

“… a sua energia é sempre aquela que em apenas um olhar, em apenas uma cara, em apenas uma personagem me diz tudo: A Velha Bonitona Pierrot.”

 Com base na Paixão, Autenticidade, Humor e Esperança que me é dada pinto a Força do Envelhecimento Feminino e inspiro Mulheres a sentirem-se bem consigo próprias.”, citação sua. Na realidade é um projeto artístico, mas também de caráter social, abraçou este projeto como uma filosofia de vida?

É cada vez mais sim. Foi-se tornando. À medida que me vou resolvendo, e este projeto é muito responsável por isso, vou estando mais e mais ao serviço. E sinto a cada dia essa vontade aumentar.

 Sinto principalmente que o meu contributo é pelo contacto, pelo estar “em relação”, o ir ao encontro, a entrega ao outro, o criar ligações saudáveis que promovam bem-estar, alegria e Esperança na Vida de todas as pessoas.

 De que forma através destas Bonitonas pode ajudar as mulheres a aceitar as suas rugas? Onde se inspira para inspirar outras mulheres a aceitar a sabedoria das rugas?

Aceitar as rugas não começa com o aparecimento delas. Vem bem antes disso. Aquilo que procuro inspirar é aceitar quem somos, e mais do que aceitar passivamente,

Ousar ser quem somos.

E nessa aceitação há um amor muito grande por nós e claro pelas nossas marcas de vida.

 

Há um provérbio alemão que diz “As árvores mais velhas dão os frutos mais doces”, é isso que representa as suas Velhas Bonitonas, o amadurecimento da sabedoria?

Acredito inteiramente e desde sempre.

O amadurecimento tem um sabor tão doce…

 “Chamamos-lhe um retrato de alma, porque não é um registo físico da pessoa, mas da sua energia.”

Ousamos ser quem somos sem complexos nem culpas”, é um mote que reflete a aceitação do passar dos anos. A Maria Seruya é uma mulher ousada que causa impacto decidiu por isso lançar as suas Velhas Bonitonas internacionalmente. Como surgiu a ideia e porquê? Como foi escolhido o nome “The Power of old Ladies”?

À medida que o projeto se foi desenhando durante estes três anos a internacionalização começou a ser um passo relevante, mas havia sempre o problema do nome que só poderia ser entendido em alguns países. Desde o inicio também utilizava muitas vezes como assinatura “Painting the Power of Old Ladies” quando queria explicar numa frase o meu projeto de forma internacional. Quando pensei mudar o nome decidi colocar nas redes sociais o pedido a todos os seguidores para darem ideias de nomes. Foi ABSOLUTAMENTE incrível a quantidade de nomes tão poderosos, criativos, inteligentes, carregados de humor. Muitas pessoas, muitas mesmo, disseram que não se deveria perder o nome Velhas Bonitonas. Eu sentia também isso, não queria perder a verdadeira identidade do nome.

O resultado final foi manter o nome Velhas Bonitonas, mas acrescentar a assinatura abreviada “The Power of Old Ladies” e assim os dois nomes coexistem, sendo que o website adquiriu o nome internacional (The Power of Old Ladies) mas o logotipo Velhas Bonitonas é bem visível em todas as paginas. Alias o único logotipo até agora com identidade visual é o “Velhas Bonitonas”.

 Das inúmeras exposições que contaram com as suas obras, há alguma que nos queira referir por lhe ter sido particularmente querida?

A da Antiga Carpintaria do Museu do Carris foi mesmo incrível, foi estrondoso o impacto social, dos media, financeiro, intergeracional.

Conheci pessoas incríveis, foi a exposição que fez com que o projeto ganhasse raízes bem fortes e asas bem reais. Recordo também o espaço com carinho, as pessoas que lá trabalhavam, foi tão bom o convívio. Nos 15 dias de exposição ficaram memórias naquele espaço de grandes emoções bem intensas e aprendizagens duradouras.

Fiz inúmeras visitas guiadas no decorrer da exposição e em todas ia descobrindo novas formas de ver, de sentir, de contemplar. Adorei tudo.

 O que dizem as Velhas Bonitonas quando olham para as suas Velhas Bonitonas?

Há de facto uma troca penso eu. As Velhas imaginarias que crio têm muita coisa a dizer e dizem a todas a Mulheres Reais que as visualizam. Mas as imaginarias só existem, só se materializam e ganham vida de facto na presença de todas estas Mulheres Reais.

São as Mulheres Reais que lhes dão vida.

E é por isso que as Velhas Bonitonas não fazem sentido só dentro do atelier, porque elas precisam de ir ao encontro destas Mulheres para ganhar vida e por outro lado, as Mulheres Reais que as visualizam também precisam delas para se construírem. Como disse, há uma troca nesta relação e tem a ver com vida.

 Se uma bonitona quiser ser retratada por si, como pode realizar esse desejo?

A forma como desenvolvemos as nossas encomendas personalizadas são em conjunto com o cliente. Projetamos na Velha Bonitona que criamos um registo do seu envelhecimento. E a forma de o fazer é em colaboração com o nosso cliente. Este escreve um texto sobre a pessoa a quem quer oferecer a obra ou se for para si própria, um texto sobre si (neste caso de ser para si própria também enviamos um questionário muito completo com perguntas sobre si) e nós criamos a partir desse texto (sem ver a pessoa) a Velha Bonitona inspirada nesse texto criativamente e de forma muito livre.

Chamamos-lhe um retrato de alma, porque não é um registo físico da pessoa, mas da sua energia.


Esta colaboração é uma forma criativa de trabalho em conjunto que o torna muito forte, especial e uma homenagem muito bonita.

Maria Seruya junto das suas obras – As Velhas Bonitonas – “O amadurecimento tem um sabor tão doce…” Em 09/12/2019  

Fonte: https://hucilluc.blog/as-velhas-bonitonas-de-maria-seruya/

Um convite do Blog Huccilluc também está no Instagram @hucilluc

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Dente-de-Leão e o Viva a Velhice

  A belíssima lenda do  dente-de leão e seus significados Segundo uma lenda irlandesa, o dente-de-leão é a morada das fadas, uma vez que elas eram livres para se movimentarem nos prados. Quando a Terra era habitada por gnomos, elfos e fadas, essas criaturas viviam livremente na natureza. A chegada do homem os forçou a se refugiar na floresta. Mas   as fadas   tinham roupas muito chamativas para conseguirem se camuflar em seus arredores. Por esta razão, elas foram forçadas a se tornarem dentes-de-leão. Comentário do Blog: A beleza  do dente-de-leão está na sua simplicidade. No convívio perene com a natureza, no quase mistério sutil e mágico da sua multiplicação. Por isso e por muito mais  é que elegi o dente-de-leão  como símbolo ou marca do Viva a Velhice. Imagem  Ervanária Palmeira   O dente-de-leão é uma planta perene, típica dos climas temperados, que espontaneamente cresce praticamente em todo o lugar: na beira de estrada, à beira de campos de cultivo, prados, planícies, colinas e

‘Quem anda no trilho é trem de ferro, sou água que corre entre pedras’ – Manoel de Barros

  Dirigido pelo cineasta vencedor do Oscar, Laurent Witz, ‘Cogs’ conta a história de um mundo construído em um sistema mecanizado que favorece apenas alguns. Segue dois personagens cujas vidas parecem predeterminadas por este sistema e as circunstâncias em que nasceram. O filme foi feito para o lançamento internacional da AIME, uma organização de caridade em missão para criar um mundo mais justo, criando igualdade no sistema educacional. O curta-animação ‘Cogs’ conta a história de dois meninos que se encontram, literalmente, em faixas separadas e pré-determinadas em suas vidas, e o drama depende do esforço para libertar-se dessas limitações impostas. “Andar sobre trilhos pode ser bom ou mau. Quando uma economia anda sobre trilhos parece que é bom. Quando os seres humanos andam sobre trilhos é mau sinal, é sinal de desumanização, de que a decisão transitou do homem para a engrenagem que construiu. Este cenário distópico assombra a literatura e o cinema ocidentais. Que fazer?  A resp

Poesia

De Mario Quintana.... mulheres. Aos 3 anos: Ela olha pra si mesma e vê uma rainha. Aos 8 anos: Ela olha para si e vê Cinderela.   Aos 15 anos: Ela olha e vê uma freira horrorosa.   Aos 20 anos: Ela olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, decide sair mas, vai sofrendo.   Aos 30 anos: Ela olha pra si mesma e vê muito gorda, muito magra, muito alta, muitobaixa, muito liso muito encaracolado, mas decide que agora não tem tempo pra consertar então vai sair assim mesmo.   Aos 40 anos: Ela se olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, mas diz: pelo menos eu sou uma boa pessoa e sai mesmo assim.   Aos 50 anos: Ela olha pra si mesma e se vê como é. Sai e vai pra onde ela bem entender.   Aos 60 anos: Ela se olha e lembra de todas as pessoas que não podem mais se olhar no espelho. Sai de casa e conquista o mundo.   Aos 70 anos: Ela olha para si e vê sabedoria, ri

Não se lamente por envelhecer

  Não se lamente por envelhecer: é um privilégio negado a muitos Por  Revista Pazes  - janeiro 11, 2016 Envelhecer  é um privilégio, uma arte, um presente. Somar cabelos brancos, arrancar folhas no calendário e fazer aniversário deveria ser sempre um motivo de alegria. De alegria pela vida e pelo o que estar aqui representa. Todas as nossas mudanças físicas são reflexo da vida, algo do que nos podemos sentir muito orgulhosos. Temos que agradecer pela oportunidade de fazer aniversário, pois graças a ele, cada dia podemos compartilhar momentos com aquelas pessoas que mais gostamos, podemos desfrutar dos prazeres da vida, desenhar sorrisos e construir com nossa presença um mundo melhor… As rugas nos fazem lembrar onde estiveram os sorrisos As rugas são um sincero e bonito reflexo da idade, contada com os sorrisos dos nossos rostos. Mas quando começam a aparecer, nos fazem perceber quão efêmera e fugaz é a vida. Como consequência, frequentemente isso nos faz sentir desajustados e incômodos

A velhice em poesia

Duas formas de ver a velhice. Você está convidado a "poetizar" por aqui . Sobre o tema que lhe agradar. Construiremos a várias mãos "o domingo com poesia". A Velhice Pede Desculpas - Cecília Meireles, in Poemas 1958   Tão velho estou como árvore no inverno, vulcão sufocado, pássaro sonolento. Tão velho estou, de pálpebras baixas, acostumado apenas ao som das músicas, à forma das letras. Fere-me a luz das lâmpadas, o grito frenético dos provisórios dias do mundo: Mas há um sol eterno, eterno e brando e uma voz que não me canso, muito longe, de ouvir. Desculpai-me esta face, que se fez resignada: já não é a minha, mas a do tempo, com seus muitos episódios. Desculpai-me não ser bem eu: mas um fantasma de tudo. Recebereis em mim muitos mil anos, é certo, com suas sombras, porém, suas intermináveis sombras. Desculpai-me viver ainda: que os destroços, mesmo os da maior glória, são na verdade só destroços, destroços. A velhice   - Olavo Bilac Olha estas velhas árvores, ma