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Adolescência e Envelhecência

Dois tempos distantes na vida, mas que se tocam por alguns pontos em comum...

Tudo bem, a palavra “envelhecência” não existe. Mas o som de senectude é muito diferente do de adolescência, o contraponto não ia ficar sonoro nem bonito. Já senescência, termo usado em Medicina, iria exigir pesquisa em dicionário e daria muito trabalho a um possível (embora raro) leitor, a quem, por respeito, quis poupar. Mas a ele desde já peço perdão pelo desajeitado e um tanto esdrúxulo neologismo. Prometo usar aspas na aludida palavra.

Feitas as devidas ressalvas, vamos ao que interessa.

As minhas conjecturas de sexagenária caminhando perigosamente e a passos largos para a “envelhecência”, me levaram a refletir sobre estas duas fases, aparentemente tão diversas, da existência do ser humano.

A distância de uma vida as separa, e é esta vida mesma a primeira diferença. Enquanto um tem-na toda à sua frente, o outro a leva à retaguarda. Um vive das esperanças e ilusões do futuro. O outro se apóia na realidade e nas recordações do passado, já agora vestido de dourado pela memória traiçoeira e fantasiosa.

Para um o tempo desliza lento, e a demora para atingir seus objetivos parece grande demais; para o outro o tempo corre numa velocidade inclemente, sem perdão.
O adolescente tem medo do ridículo e necessita da aprovação do grupo para sentir-se adequado. O “envelhecente” já perdeu o medo do ridículo e não precisa mais da aprovação de ninguém. Mesmo porque, muitos dos de sua tribo já se foram e não podem mais reprová-lo nem avalizá-lo.

Se o adolescente quer barulho, movimento, mudanças, o “envelhecente” deseja silêncio, sossego, rotina.
Ambos sonham, porque “envelhecente’ ainda sonha, graças a Deus. A diferença é que os sonhos do adolescente estão todos por realizar e, entre os sonhos do ”envelhecente”, se alguns se realizaram, outros, por impossíveis, foram descartados como roupa velha e só deixaram saudade.
Entretanto, apesar de tantas diferenças, algumas semelhanças os unem.
Na realidade, adolescentes e “envelhecentes” se encontram num limbo.
Um, entre a infância e a vida adulta. Já perdeu o privilégio de fazer as bobagens típicas da criança e ainda não adquiriu o direito de fazer as bobagens do adulto. Precisa provar a todo o instante que já tem juízo, que pensa por si e pode decidir o que deseja.

O “envelhecente” situa-se entre a vida adulta e a velhice propriamente dita, ou a caduquice, segundo alguns. Às vezes já voltou realmente a ser criança, outras é tratado como tal. Precisa provar a todo o instante que ainda tem juízo, que pensa por si e pode decidir o que deseja.
São, pois, adolescência e “envelhecência”, extremos que se tocam tendo de permeio a vida que não cessa de fluir.

Por Lúcia Edwiges Narbot Ermetice Médica, nascida em 11/12/1944, poeta nas horas vagas, quando a inspiração permitir.  Fonte: www.escrita.com.br/

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