Pular para o conteúdo principal

Pedro Casaldáliga, 90 anos: bispo e poeta

Pedro Casaldáliga, 90 anos: bispo, poeta e defensor intransigente da dignidade humana

Diante das críticas contra Dom Casaldáliga, o Papa Paulo VI exclamou: “Encostar no bispo de São Félix do Araguaia é como encostar no papa”.

A reportagem é de Francesco Gagliano, publicada no sítio Il Sismografo, 30-01-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Pedro Casaldáliga, bispo emérito de São Félix, no Brasil, e grande defensor dos pobres, completará 90 anos em fevereiro. Para a ocasião, foi organizada em Madri, na quinta-feira, 1º de fevereiro, por iniciativa das associações Mensajeros de la Paz e Tierra Sin Males, e do sítio Religión Digital, uma coletiva de imprensa e uma série de atividades culturais para prestar homenagem à figura de Dom Casaldáliga.

Nascido na Catalunha no dia 16 de fevereiro de 1928, durante 38 anos, viveu e trabalhou no Brasil, primeiro como missionário da Congregação dos Missionários Filhos do Coração Imaculado de Maria, ou Congregação Claretiana, depois como prelado de São Félix a partir 1971, ordenado bispo em outubro do mesmo ano por Paulo VI.

Obstinado e corajoso, coerente e firme nas suas convicções, simples e aberto, Dom Pedro trabalhou em um dos lugares mais infelizes e pobres do mundo, o Mato Grosso. Da prelazia de São Félix, da qual foi primeiro bispo e fundador, Dom Casaldáliga tornou-se o porta-voz para dar a conhecer ao Brasil e ao mundo inteiro as condições de vida de agricultores e índios.

A partir desse canto perdido do mundo, injustiças foram denunciadas, sacudindo consciências e instituições, atraindo o interesse de muitas pessoas, contribuindo para o desenvolvimento social do país, constituindo um ponto firme para a retomada da democracia após o período sombrio da ditadura militar.

Por causa do seu compromisso religioso, social e político, ele foi hostilizado dentro e fora da Igreja. Em alguns ambientes, era considerado como um bispo “subversivo e extremista”, “impertinente e incômodo”, cujo magistério “era perigoso por estar embebido demais na teologia da libertação”.

A vocação evangélica de Dom Casaldáliga, totalmente voltada aos últimos e aos esquecidos, logo foi reconduzida a essa leitura “subversiva” e “revolucionária” da teologia da libertação, uma interpretação redutiva e filha de uma profunda incompreensão e oposição àquela que foi a verdadeira missão de Dom Pedro.

É importante lembrar que o próprio Papa Paulo VI, para conter os ataques políticos (a ditadura militar tentou várias vezes expulsar Dom Casaldáliga do país) e eclesiásticos contra o bispo de São Félix, o defendeu abertamente com as seguintes palavras: “Encostar no bispo de São Félix do Araguaia é como encostar no papa”. Um fato que fala muito sobre as divisões dentro da própria Igreja acerca da obra daqueles padres que lutavam e ainda lutam para melhorar as condições dos pobres na África ou na América do Sul, e que algumas hierarquias eclesiásticas, apressadamente demais, indicam como “subversivas” ou “heréticas”.

A partir de 2 de fevereiro de 2005, quando São João Paulo II aceitou sua renúncia, Dom Pedro não é mais bispo de São Félix, mas ficou vivendo no Brasil, na sua cidade, no seu bairro e entre seu povo, com humildade e modéstia. As recentes conversas com o diretor do Religión Digital, José Manuel Vidal, mostram como esse grande homem da Igreja é coerente ainda hoje com sua vocação e com o Evangelho que encarnou ao longo de sua vida.

Nota da IHU On-Line – Confira aqui, em espanhol, o programa das celebrações na Espanha por ocasião dos 90 anos de Dom Casaldáliga. Fonte: www.ihu.unisinos.br/

Nota do Blog: Dom Pedro Casldáliga (92) faleceu no dia 8 de agosto de 2020, aqui minha homenagem.


"Sólo sé que no sé mucho de lo que sabía antes (de memoria, por decreto). Sólo sé que soy más libre, aprendiendo a ser el hombre siendo el indio. Ratifico, en todo caso, que me da la real gana de seguir siendo poeta. De vivir por la utopía. De morir en la esperanza" #Diálogos1978


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Dente-de-Leão e o Viva a Velhice

  A belíssima lenda do  dente-de leão e seus significados Segundo uma lenda irlandesa, o dente-de-leão é a morada das fadas, uma vez que elas eram livres para se movimentarem nos prados. Quando a Terra era habitada por gnomos, elfos e fadas, essas criaturas viviam livremente na natureza. A chegada do homem os forçou a se refugiar na floresta. Mas   as fadas   tinham roupas muito chamativas para conseguirem se camuflar em seus arredores. Por esta razão, elas foram forçadas a se tornarem dentes-de-leão. Comentário do Blog: A beleza  do dente-de-leão está na sua simplicidade. No convívio perene com a natureza, no quase mistério sutil e mágico da sua multiplicação. Por isso e por muito mais  é que elegi o dente-de-leão  como símbolo ou marca do Viva a Velhice. Imagem  Ervanária Palmeira   O dente-de-leão é uma planta perene, típica dos climas temperados, que espontaneamente cresce praticamente em todo o lugar: na beira de estrada, à bei...

Os dentes e o contato social

Antônio Salazar Fonseca é membro da Sociedade Brasileira de Odontologia Estética Crédito: Juliana Causin/CBN. sábado, 19/09/2015, 09:30  'Ausência dos dentes leva à ruptura do contato social', afirma dentista. Antônio Salazar Fonseca explica que a prevenção é fundamental para manter a saúde da boca. Segundo ele, as próteses têm tempo de vida útil, portanto os usuários devem renová-las. http://cbn.globoradio.globo.com/programas/50-mais-cbn/2015/09/19/AUSENCIA-DOS-DENTES-LEVA-A-RUPTURA-DO-CONTATO-SOCIAL-AFIRMA-DENTISTA.htm "É importante que qualquer pessoa visite o dentista de seis em seis meses. Em caso de próteses, elas devem ser reavaliadas a cada dois anos, o que, geralmente, não acontece. Maioria da população não tem dentes naturais Com as próteses, o problema cresce ainda mais. A maioria das pessoas não tem o hábito de fazer a manutenção constante regularmente e, com o passar dos anos, elas vão ficando desadaptadas. "Muitos deixam até de usá-las e acabam ingerindo...

‘Quem anda no trilho é trem de ferro, sou água que corre entre pedras’ – Manoel de Barros

  Dirigido pelo cineasta vencedor do Oscar, Laurent Witz, ‘Cogs’ conta a história de um mundo construído em um sistema mecanizado que favorece apenas alguns. Segue dois personagens cujas vidas parecem predeterminadas por este sistema e as circunstâncias em que nasceram. O filme foi feito para o lançamento internacional da AIME, uma organização de caridade em missão para criar um mundo mais justo, criando igualdade no sistema educacional. O curta-animação ‘Cogs’ conta a história de dois meninos que se encontram, literalmente, em faixas separadas e pré-determinadas em suas vidas, e o drama depende do esforço para libertar-se dessas limitações impostas. “Andar sobre trilhos pode ser bom ou mau. Quando uma economia anda sobre trilhos parece que é bom. Quando os seres humanos andam sobre trilhos é mau sinal, é sinal de desumanização, de que a decisão transitou do homem para a engrenagem que construiu. Este cenário distópico assombra a literatura e o cinema ocidentais. Que fazer...

Chapéu Violeta - Mário Quintana

Aos 3 anos: Ela olha pra si mesma e vê uma rainha. Aos 8 anos: Ela olha para si e vê Cinderela. Aos 15 anos: Ela olha e vê uma freira horrorosa. Aos 20 anos: Ela olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, decide sair mas, vai sofrendo. Aos 30 anos: Ela olha pra si mesma e vê muito gorda, muito magra, muito alta, muitobaixa, muito liso muito encaracolado, mas decide que agora não tem tempo pra consertar então vai sair assim mesmo. Aos 40 anos: Ela se olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, mas diz: pelo menos eu sou uma boa pessoa e sai mesmo assim. Aos 50 anos: Ela olha pra si mesma e se vê como é. Sai e vai pra onde ela bem entender. Aos 60 anos: Ela se olha e lembra de todas as pessoas que não podem mais se olhar no espelho. Sai de casa e conquista o mundo. Aos 70 anos: Ela olha para si e vê sabedoria, risos, habilidades, sai para o mundo e aproveita a vida. Aos 80 an...

Se puder envelheça

Os poetas tem o dom de saber colocar em palavras coisas que sentimos e não sabemos explicar, quando se trata de velhice as opiniões divergem muito, e como poeta, talvez Oswaldo Montenegro te convença a olhar para o envelhecimento com outro olhar, mais gentil com sua história, mais feliz com seu presente. Leia: “A pergunta é, que dia a gente fica velho? Não vem dizer que ‘aos poucos’, colega, faz 5 minutos que eu tinha 17 anos e fui-me embora de Brasília, pra mim meu primeiro show foi ontem, e hoje eu tô na fila preferencial pra embarcar no avião. Tem um garoto dentro de mim que não foi avisado de que o tempo passou e tá louco pra ter um filho, e eu já tenho netos. Aconteceu de repente, o personagem do Kafka acordou incerto, eu acordei idoso, e olha que eu ando, corro, subo escadas e sonho como antes. Então o quê que mudou? Minha saúde e minha energia são as mesmas, então o quê que mudou? Bom, a unica coisa que eu sei que mudou mesmo foi o tal do ego, a gente vai descobrindo que não...