Tem palavras limpas como compaixão, generosidade, solidariedade.
Tem palavras que cheiram como pão de queijo, café, doce de leite, perfume, flor, mato, erva-doce, manjericão, mirra.
Comentário do Blog: Aprendi o caminho. dos textos da Déa Januzzi,. Uma forma poética e também real de dizer muito. A fórmula para rechear de leve beleza o Viva a Velhice. Com a palavra Déa:Enquanto lia avidamente “A revolução dos Idosos”, de Frank Schirrmacher, uma dúvida acabou virando este texto. Será que as palavras também envelhecem? Ela acha que sim e se lembrou de uma palavra velha, que foi expulsa do vocabulário atual – progresso, que foi substituída por caos urbano.
O crescimento das metrópoles hoje nada mais é do que caótico. O progresso ficou no passado, no fundo do dicionário. Assim como anágua, combinação, cueiro, galocha, unguento, colosso, vinil, radiola, toca-disco, rapariga, pederasta, guri, playboy, penteadeira, pueril.
Tem palavras que ardem, como inveja, despeito, vingança, miséria, abandono. Tem palavras que acalmam, como rio, sorriso, mar, verde, praia, vento, doce, pipa, algodão-doce, pão de mel, orquídea, calmaria, rede, sossego, silêncio, girassol.Tem palavras infinitamente densas, como universo, estrelas, cometas, constelação, lua, sol.
Tem palavras amigas como Roberto Drummond, Irmão Mesquita, Drª Alba, Flávio Cançado, Magui, Ana Cecília, Maya, Cristina, Janaína. Quer palavra mais amiga do que irmão, mesmo que os seus estejam distantes de você e hoje sejam quase estranhos?
Tem palavras etéreas e transparentes, como anjo, amizade, verdade, lucidez, asas, imaginação, criatividade, arte. Tem palavras egocêntricas como sou, vou, eu posso, tenho, consumo, quero. Tem palavras impróprias como feio, gordo, mal-educado, grosso. E outras palavras enganosas, como desculpa, licença, meu bem, querida.
Tem palavras nervosas como competição, poder, estresse, fúria, dinheiro, sucesso. Tem palavras sujas como guerra, bomba, crime, assassinato, mentira, violência, vingança, que nem se forem lavadas mil vezes com sabão de barra ou em pó, não vão ficar limpas nunca. Nem se colocar no sol, bater naqueles tanques antigos ou em modernas máquinas de lavar, vão sempre deixar um rastro de sujeira, uma sombra escura.
Tem palavras limpas como compaixão, generosidade, solidariedade. Tem palavras que cheiram como pão de queijo, café, doce de leite, perfume, flor, mato, erva-doce, manjericão, mirra.Tem palavras que entristecem como saudade, perda, separação, vazio, solidão.
Tem palavras que violentam como assédio, prostituta, pedofilia, estupro, invasão, medo, insegurança, corrupção, golpe, preconceito, discórdia, indiferença. Existem outras palavras que ventam como pipa, carossel, roda-gigante, saia, cabelo, bolinha de sabão, folhas secas, bandeira, biruta, montanha-russa, circo.Tem palavras leves, como ternura, afeto, gratidão, abraço.Tem palavras pesadas, como raiva, ódio, mágoa, inveja, ganância.
Palavras que sangram, como punhal, nome-feio, revólver, soco, revolta, abandono. Palavras que confortam como mãe, coração, segurança, harmonia, equilíbrio.
Palavras quentes como sexo, beijo, tesão, paixão, desejo, orgasmo, fogo, vermelho, sangue, menstruação. Palavras estrangeiras, cashemere, buquê, bufê, bamboniére, delicatessen, chaise-longue, lingerie.
Leia também: Palavras que sumiram do mapa
As palavras não caducam mais. Elas têm Alzheimer. Ficam dementes, insanas e às vezes se esquecem que é hora de colocar um ponto final. Não dá mais para interrogar ou exclamar. As palavras às vezes são surdas e não ouvem os sinais do tempo. Outras vezes as palavras ficam cegas, sem visão de futuro. Mesmo que os sonhos nunca envelheçam, as palavras às vezes ficam decrépitas, se congelam no tempo. Juventude, por exemplo, é uma palavra velha num mundo de cabelos brancos.
Existem palavras para todas as situações e emoções, para todos os gostos. Palavras curtas e longas. Palavras que mordem, que cortam, ferem e outras que sopram. Existem palavras redondas, compridas, solitárias, para cada momento, para cada dor, para cada dia.
Déa Januzzi é jornalista e escritora e está no www.50emais.com.br e www.deajanuzzi.com
Excelente reflexão!
ResponderExcluirBom dia, Risô!
ResponderExcluirGosto de te ver por aqui.
Faça sugestões, eu aceito.
Um abração.
"As palavras não caducam. Elas têm Alzheimer"
ResponderExcluirA Dea tem uma maneira inteligente de ver/dizer coisas de maneira diferente.
Bom dia Rute Dea Januzzi tem um talento especial para "manipular" as palavras.
ResponderExcluirMuito bom querida prima, gostei muito da forma como descreveste cada palavra. A palavra escrita é morta, dizia um amigo. Mas, acrescento que essa palavra morta interpretada com o coração, é mais viva que a própria vida, pois estará carregada de emoção, com o sentimento de quem recita.
ResponderExcluirPara muitos ser velho, é um peso, mas acredito que a idade nos dá coisas que os jovens desejam ardorosamente, e terão que esperar a idade chegar, e muitos não conseguem.
Um beijo no seu coração, porque a gurizada vem atras, assim é a vida!
Onofre Vieira
Onofre Antônio, mil gracias por teres escolhido andar pelo Viva a Velhice.
ResponderExcluirEssas belezas poéticas que aprecem por aqui tem outros criadores.
As palavras envelhecem é um artigo de Déa Jacuzzi, para mim, a maga das palavras.
Abraços.