Afinal, idoso é sempre o outro e a resposta para algumas perguntas, frequentemente são “Não, não estou tão velho assim”.
Envelhecer é um processo comum a todos os seres vivos. Sabemos que ele começa logo após o nascimento e alguns autores defendem que ele se inicia antes disso.
Conceitualmente a velhice é a última etapa da vida. Socialmente, no Brasil, a velhice se inicia aos 60 anos mas quando a “inauguramos” é algo muito individual. Ouvimos alguns relatos a respeito deste momento, por exemplo, quando se dá entrada na aposentadoria, ou que os filhos começam a sair de casa, quando nasce um neto, quando se completa 60 anos e muitas outras situações que podem inaugurar em nós a nossa “velhice”.
Quando foi a sua? Quando será a minha? Está relacionado à idade ou aos cabelos brancos? Ou a dor nos joelhos?
Apesar de ser um momento particular e estar relacionado com as nossas próprias vivências e experiências, tenho tido a oportunidade de participar, mesmo não sendo previamente convidada, para algumas “inaugurações”. Faço isso através da minha prática profissional diária.
O sistema de saúde no Brasil vem evoluindo muito no que diz respeito ao olhar diferenciado à população 60+. Talvez estejamos atrasados frente a velocidade em que nosso país envelhece, mas é fato que estamos caminhando no sentido de tentar oferecer a assistência mais qualificada possível a esta população que apresenta necessidades tão específicas.
Dentro deste contexto, nos serviços especializados, lançamos mão de diversas ferramentas de avaliação que visam rastrear fragilidades em estágios iniciais, com o objetivo de revertê-las, retardá-las ou amenizá-las. Não pretendemos agir apenas quando o paciente já está adoecido. Agimos também na prevenção.
Avaliamos aqueles que não apresentam queixas de saúde, com a percepção de autoeficácia elevada e é nestes pacientes que, algumas vezes, temos a sensação de inaugurar a velhice. À estes pacientes apresentamos possibilidades, situações que podem ser esperadas porque ele “passou dos 60, dos 70 anos”... Mas que ele desconhecia quase que completamente antes de realizar a sua avaliação em saúde.
É aquele famoso “idoso ativo”, engajado em questões políticas, que trabalha, paga suas contas, cuida de sua casa e de sua família. O idoso praticante de atividade física, com um bom círculo de amizade e uma vida social repleta de reuniões com amigos, festas de família e viagens.
Com o objetivo de auxiliá-lo a manter-se assim pelo máximo de tempo possível, nós avaliamos sua funcionalidade com questionários validados, compostos por questões do tipo: “Você perde urina sem querer?”. “Quantas quedas você sofreu este ano?”. Ou “Você está engasgando quando se alimenta?”. “Consegue subir e descer degraus sem dificuldade?”. “Tem dificuldade para passar de sentado para em pé?”. Todos estes questionamentos são pertinentes e rastreiam condições antes que se tornem um problema de saúde importante e, isso é, sem dúvida, uma evolução na área da saúde.
A maioria dos pacientes que passam pelas avaliações saem falando da satisfação e sentem-se agradecidos pela atenção especializada que lhe foi oferecida, mas também é perceptível a estranheza que algumas questões geram em alguns idosos. Afinal, idoso é sempre o outro e a resposta para estas perguntas, frequentemente são “Não, não estou tão velho assim”.
Após este checkup preventivo, ao deixar o consultório, é perceptível a satisfação do cliente que se sente realmente atendido e ouvido, e por vezes, é perceptível também, seu desnorteio por ter sido colocado frente a frente com questões trazidas pelo envelhecimento e apresentá-lo a possibilidades de uma velhice frágil.
Artigo de Gabriela Goldstein - Fisioterapeuta da Unidade de Referência em Saúde do idoso (URSI) OSACSC - PMSP. Mestre em Ciências pela USP, especialista em Gerontologia Social pela PUC SP. Email: gabriela.correia@gmail.com.
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