Os conceitos expressos no
título desta reflexão têm sido objeto de crescente interesse e estudos na área
gerontológica, à qual nos dedicamos há cerca de 20 anos. Neste período,
significativos foram os progressos técnicos e científicos na área da saúde,
garantindo a crescente longevidade observada no cotidiano, especialmente nos
países em desenvolvimento como o Brasil.
As áreas da religiosidade e espiritualidade
pareciam estar muito distantes de qualquer abordagem na área da saúde,
considerando, neste caso, a medicina tradicional alopática. De forma gradativa,
e graças a alguns estudos pioneiros, a temática subjetiva da espiritualidade
começou a ser observada e estudada de forma sistemática por pesquisadores na
área das ciências médicas.
A partir de uma pesquisa-piloto realizada pelo
Grupo de Estudos da Memória (GEM) do Núcleo de Estudo e Pesquisa do
Envelhecimento (NEPE) do Programa de Estudos Pós-Graduados em Gerontologia da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), entre 2005-2009,
abordamos os temas espiritualidade e longevidade, motivados pelas demandas
advindas das práticas dos pesquisadores junto à população idosa, que resultou
na publicação do livro Longevidade e Espiritualidade – Narrativas Autobiográficas (2011).
O principal objetivo do GEM é a formação
continuada interdisciplinar, não apenas como estudo e debate de ideias, mas,
principalmente, por meio de trabalhos práticos, que buscam valorizar as
experiências advindas do exercício de diferentes profissões, tanto as relativas
à formação disciplinar como as dos diversos espaços e modos de atuação. Os
profissionais participantes buscam um espaço de estudo e interlocução, visando
o aperfeiçoamento de ações consistentes e humanizadas junto à população idosa,
tendo como referência suas complexidades e subjetividades.
O interesse permanente no tema nos levou à
leitura de Medicina, Religião e Saúde (Koenig, H.
2012), no qual tivemos contato com inúmeras pesquisas realizadas, por
diferentes autores, nas áreas da saúde física e mental. O autor nos alerta para
as numerosas controvérsias e polêmicas gerados por esses estudos, o que não o
afasta do objetivo de “integrar parte das pesquisas recentes sobre religião
espiritualidade e saúde [...] e investigar o que isso significa para médicos,
pacientes e aqueles que estão saudáveis e desejam permanecer assim”.
O término da leitura deste livro coincidiu com
a realização do 2º Simpósio “Ciência,
Espiritualidade e Saúde”, realizado no mês de
outubro 2013, pela Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP. O objetivo do
Simpósio era “dar continuidade ao estudo e a reflexão da humanização em todos
os setores de nossa vida, com enfoque na espiritualidade, para proporcionar uma
melhor qualidade de vida na abordagem da saúde”.
Segundo seus organizadores “este tema vem
apresentado grande interesse dos cientistas e pesquisadores em todo o mundo,
demonstrando os benefícios e a constatação dos resultados positivos na inserção
da espiritualidade na saúde e nos mais diversos setores da sociedade”.
“A espiritualidade, segundo diversos autores,
dentro de uma abordagem científica desenvolve a compreensão do próprio “eu” e a
sua relação com o mundo, estabelecendo uma conexão com o que entendemos e
sentimos como “divino”. Proporciona também um maior equilíbrio biopsicossocial,
além de elevar a consciência a um nível de confiança no presente e no futuro”.
O Simpósio proporcionou dois dias de aprendizado,
reflexões e vivências práticas, com renomados profissionais, que ampliaram
nossa compreensão sobre o processo de “construção da vida”.
Uma linha comum indicou a busca da
integralidade do ser como estratégia para minimizar os conflitos internos, desencadeadores
de problemas físicos e emocionais, que se retroalimentam, comprometendo a saúde
e a qualidade de vida. Acreditamos que a integralidade pode ser alcançada pelo
retorno ao “si mesmo”, o desenvolvimento da atenção na preservação do
equilíbrio e harmonia interior, a ser atingido por meio da meditação, fator de
autoconhecimento, que reduz o stress, os sintomas depressivos, e promove maior
equilíbrio emocional.
Abordando o tema “Sofrimento Humano e Resiliência”, o Dr Plínio Montagna nos
fez refletir a respeito da resiliência, como possibilidades de enfretamento e
superação de crises. Ela é uma capacidade inata ou pode ser desenvolvida?
Do latim resilire - saltar para trás e voltar – é a capacidade
do ser humano de adaptar-se / adequar-se, lutar frente a situações
adversas e recomeçar, e que pode influir na experiência, saúde e qualidade
de vida. Segundo ele, os pilares da resiliência são: Introspecção - a arte de
perguntar-se; Autonomia em relação ao meio; Criação de laços
afetivos; Iniciativa; Humor; Criatividade; Moralidade; Bem estar
compartilhado; Autoestima forte.
Indagamos: a religiosidade e espiritualidade
não podem ser consideradas formas de resiliência / resistência? Ao longo da
trajetória humana, a sensação de inacabamento do sujeito não tem sido
preenchida pela busca de um sentido para a vida, além de sua materialidade?
Podemos encontrar na espiritualidade, como
fator de equilíbrio e resiliência, a possibilidade de uma longevidade plena de
significados, para além das múltiplas fragilidades? Afirma Koenig (2012) que as
pesquisas indicam que “as crenças religiosas e espirituais [...] estão ligadas
à saúde e bem estar [...] aprender a respeitar o poder dessas crenças e
utilizá-las para acelerar a cura e a recuperação total do paciente deve ser
prioridade para a medicina e atendimento médicos modernos”.
Um caminho a percorrer...
Referências
Brandão, V.M. A.
T. (2011). Longevidade e Espiritualidade. Narrativas Autobiográficas.
São Paulo: Centro Universitário São Camilo; Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo.
Koenig, H.G. (2012). Medicina, Religião e
Saúde. Porto Alegre, RS: L&PM.
(*)Vera Brandão é Pedagoga (USP). Mestre e
Doutora em Ciências Sociais – Antropologia PUCSP. Pesquisadora do Núcleo de
Estudos e Pesquisa do Envelhecimento (NEPE) do Programa de Estudos
Pós-Graduados em Gerontologia da PUCSP e Mediadora do Grupo de Estudo da
Memória – GEM. Pesquisadora do Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares
do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação – Currículo, da PUCSP. Email: veratordinobrandao@hotmail.com. Editora da
Revista Portal de
Divulgação
Fonte: http://portaldoenvelhecimento.com/revista/index.php/revistaportal.
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