Pular para o conteúdo principal

As representações sociais propostas pela mídia

Nos tempos atuais, a mídia se apresenta como portadora de extrema influência na vida das pessoas.


Comentário do Blog: No dia 8, sábado, postei a poesia A velhice pede desculpas de Cecília Meirelles. Hoje, Carolina Balbino Moreira Ferreira e Ruth Gelehrter da Costa Lopes (*) encerram o texto citando a poesia e a analisando no contexto do tema.



As representações sociais propostas pela mídia atual sobre os idosos apresentam-se, em sua maioria, entre dois polos extremos: do velho como aquele que ainda pode tudo ou como aquele que não pode mais nada. As duas opções são complicadas, pois fogem da realidade. O velho, antes de tudo, é uma pessoa que possui uma história de vida única e uma relação com o mundo também única.


Nos tempos atuais, a mídia se apresenta como portadora de extrema influência na vida das pessoas. Isto é, o que ela diz à população é usado como forma de legitimar discursos, ideias e pontos de vista. Sendo assim, tanto de forma positiva quanto negativa, a mídia cria representações sociais sobre diferentes assuntos, sendo a velhice um deles. 
Ainda, tais representações sociais se caracterizam em estereótipos: blocos de significações acerca de um tema que, muitas vezes, impedem o pensamento de uma avaliação real e justa. Pode-se pensar, então, que esses estereótipos criados sobre a velhice e os velhos tenham consequências não somente no modo como os idosos são vistos pela sociedade, mas também, como os próprios velhos se veem. 
Refletindo sobre essas questões, trazemos o poema de Cecília Meireles “A velhice pede desculpas”:
“Tão velho estou como árvore no inverno, vulcão sufocado, pássaro sonolento.

Tão velho estou, de pálpebras baixas, acostumado apenas ao som das músicas, à forma das letras.

Fere-me a luz das lâmpadas, o grito frenético dos provisórios dias do mundo: Mas há um sol eterno, eterno e brando e uma voz que não me canso, muito longe, de ouvir.

Desculpai-me esta face, que se fez resignada: já não é a minha, mas a do tempo, com seus muitos episódios.

Desculpai-me não ser bem eu: mas um fantasma de tudo.

Recebereis em mim muitos mil anos, é certo, com suas sombras, porém, suas intermináveis sombras.

Desculpai-me viver ainda: que os destroços, mesmo os da maior glória, são na verdade só destroços, destroços”.

Há um bom tempo, a imagem que vem sendo difundida pela mídia sobre o idoso, principalmente pelo jornalismo, é de alguém extremamente frágil e que, portanto, necessita de cuidados a todo o momento. Este fator trouxe, ainda, a comparação do velho com uma criança. Sendo assim, sua infantilização pode ter sido o principal precursor da outra ideia, a de que o idoso é um fardo, uma vez que precisa, a todo o momento, da atenção de alguém para sobreviver. 

Outro ponto bastante ressaltado no jornalismo é a imagem do idoso relacionada a aposentadoria e previdência; velhos em uma enorme fila de espera do recebimento da aposentadoria, por exemplo. Esta, também é traduzida como algo negativo, pois aponta para a exclusão, marginalização e carência que se sofre quando se envelhece.
Desta forma, é possível compreender o porquê do narrador do poema “A velhice...” pedir desculpas em cada estrofe. Ele mesmo se vê como um fardo, isto é, como uma pessoa que nada tem a acrescentar e é somente um “fantasma de tudo”.

Ele, ainda, pede desculpas pela aparência que possui: o que faz lembrar as propagandas de plásticas faciais e corporais existentes atualmente. Parte da mídia exibe o corpo do velho como algo indesejável, oferecendo múltiplas formas de postergá-lo a qualquer preço. 

Por fim, o narrador pede desculpas por ainda estar vivo, entendendo a si mesmo como somente “destroços” de alguém que, um dia, já foi jovem.

As representações sociais propostas pela mídia atual sobre os idosos apresentam-se, em sua maioria, entre dois polos extremos: do velho como aquele que ainda pode tudo ou como aquele que não pode mais nada. 

As duas opções são complicadas, pois fogem da realidade. O velho, antes de tudo, é uma pessoa que possui uma história de vida única e uma relação com o mundo também única. Assim, não existe somente uma maneira de ser idoso, mas sim uma heterogeneidade de formas de se chegar e se levar essa fase da vida.

A população idosa, assim como a de outras faixas etárias, é heterogênea e deve ser mostrada assim pela mídia (fato este que já vem sendo mais abordado pelas propagandas televisivas). Até porque, ninguém deve se desculpar por ser do jeito que é. 

(*) Carolina Balbino Moreira Ferreira - Aluna do curso de graduação de Psicologia, da Pontifícia Universidade Católica – PUCSP, 5º semestre. Email: carolinabalbino@uol.com.brO endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. . Ruth Gelehrter da Costa Lopes - Supervisora Atendimento Psicoterapêutico à Terceira Fase da Vida. Profa. Dra. Programa Estudos Pós Graduados em Gerontologia e no Curso de Psicologia, FACHS. Email: ruthgclopes@pucsp.br

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O Dente-de-Leão e o Viva a Velhice

  A belíssima lenda do  dente-de leão e seus significados Segundo uma lenda irlandesa, o dente-de-leão é a morada das fadas, uma vez que elas eram livres para se movimentarem nos prados. Quando a Terra era habitada por gnomos, elfos e fadas, essas criaturas viviam livremente na natureza. A chegada do homem os forçou a se refugiar na floresta. Mas   as fadas   tinham roupas muito chamativas para conseguirem se camuflar em seus arredores. Por esta razão, elas foram forçadas a se tornarem dentes-de-leão. Comentário do Blog: A beleza  do dente-de-leão está na sua simplicidade. No convívio perene com a natureza, no quase mistério sutil e mágico da sua multiplicação. Por isso e por muito mais  é que elegi o dente-de-leão  como símbolo ou marca do Viva a Velhice. Imagem  Ervanária Palmeira   O dente-de-leão é uma planta perene, típica dos climas temperados, que espontaneamente cresce praticamente em todo o lugar: na beira de estrada, à beira de campos de cultivo, prados, planícies, colinas e

‘Quem anda no trilho é trem de ferro, sou água que corre entre pedras’ – Manoel de Barros

  Dirigido pelo cineasta vencedor do Oscar, Laurent Witz, ‘Cogs’ conta a história de um mundo construído em um sistema mecanizado que favorece apenas alguns. Segue dois personagens cujas vidas parecem predeterminadas por este sistema e as circunstâncias em que nasceram. O filme foi feito para o lançamento internacional da AIME, uma organização de caridade em missão para criar um mundo mais justo, criando igualdade no sistema educacional. O curta-animação ‘Cogs’ conta a história de dois meninos que se encontram, literalmente, em faixas separadas e pré-determinadas em suas vidas, e o drama depende do esforço para libertar-se dessas limitações impostas. “Andar sobre trilhos pode ser bom ou mau. Quando uma economia anda sobre trilhos parece que é bom. Quando os seres humanos andam sobre trilhos é mau sinal, é sinal de desumanização, de que a decisão transitou do homem para a engrenagem que construiu. Este cenário distópico assombra a literatura e o cinema ocidentais. Que fazer?  A resp

Poesia

De Mario Quintana.... mulheres. Aos 3 anos: Ela olha pra si mesma e vê uma rainha. Aos 8 anos: Ela olha para si e vê Cinderela.   Aos 15 anos: Ela olha e vê uma freira horrorosa.   Aos 20 anos: Ela olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, decide sair mas, vai sofrendo.   Aos 30 anos: Ela olha pra si mesma e vê muito gorda, muito magra, muito alta, muitobaixa, muito liso muito encaracolado, mas decide que agora não tem tempo pra consertar então vai sair assim mesmo.   Aos 40 anos: Ela se olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, mas diz: pelo menos eu sou uma boa pessoa e sai mesmo assim.   Aos 50 anos: Ela olha pra si mesma e se vê como é. Sai e vai pra onde ela bem entender.   Aos 60 anos: Ela se olha e lembra de todas as pessoas que não podem mais se olhar no espelho. Sai de casa e conquista o mundo.   Aos 70 anos: Ela olha para si e vê sabedoria, ri

Não se lamente por envelhecer

  Não se lamente por envelhecer: é um privilégio negado a muitos Por  Revista Pazes  - janeiro 11, 2016 Envelhecer  é um privilégio, uma arte, um presente. Somar cabelos brancos, arrancar folhas no calendário e fazer aniversário deveria ser sempre um motivo de alegria. De alegria pela vida e pelo o que estar aqui representa. Todas as nossas mudanças físicas são reflexo da vida, algo do que nos podemos sentir muito orgulhosos. Temos que agradecer pela oportunidade de fazer aniversário, pois graças a ele, cada dia podemos compartilhar momentos com aquelas pessoas que mais gostamos, podemos desfrutar dos prazeres da vida, desenhar sorrisos e construir com nossa presença um mundo melhor… As rugas nos fazem lembrar onde estiveram os sorrisos As rugas são um sincero e bonito reflexo da idade, contada com os sorrisos dos nossos rostos. Mas quando começam a aparecer, nos fazem perceber quão efêmera e fugaz é a vida. Como consequência, frequentemente isso nos faz sentir desajustados e incômodos

A velhice em poesia

Duas formas de ver a velhice. Você está convidado a "poetizar" por aqui . Sobre o tema que lhe agradar. Construiremos a várias mãos "o domingo com poesia". A Velhice Pede Desculpas - Cecília Meireles, in Poemas 1958   Tão velho estou como árvore no inverno, vulcão sufocado, pássaro sonolento. Tão velho estou, de pálpebras baixas, acostumado apenas ao som das músicas, à forma das letras. Fere-me a luz das lâmpadas, o grito frenético dos provisórios dias do mundo: Mas há um sol eterno, eterno e brando e uma voz que não me canso, muito longe, de ouvir. Desculpai-me esta face, que se fez resignada: já não é a minha, mas a do tempo, com seus muitos episódios. Desculpai-me não ser bem eu: mas um fantasma de tudo. Recebereis em mim muitos mil anos, é certo, com suas sombras, porém, suas intermináveis sombras. Desculpai-me viver ainda: que os destroços, mesmo os da maior glória, são na verdade só destroços, destroços. A velhice   - Olavo Bilac Olha estas velhas árvores, ma